Há poucos como Camilo. Quando se coloca em causa a remoção de uma estátua pelo “desgosto estético” e “desaprovação moral” percebemos que é triste o debate. Felizmente a ideia de retirada não avançou. Movimentos destes a acontecer causam náuseas de tanto “puritanismo”. Como se quem visualiza a arte não fosse capaz de interpretar o objeto artístico. O que estes puritanos querem fazer é pressupor-nos de ignorantes que precisamos da polícia da moralidade para nos salvar. Lamentável.
Arrumado este assunto, aproveito para propor aos signatários deste tipo de movimentos, que classifico de “polícias da moralidade”, não as novelas da televisão, que deverá ser o que andam a contemplar, e mais as novelas de Camilo. Talvez descobrissem destas um enredo mais generoso e aprimorado do que na TV. Fica a sugestão.
Todos conhecemos Castelo Branco, vimos nele um pequeno génio com uma capacidade literária pouco vista, ainda mais conhecendo os contornos da sua vida. Aproveito estar a escrever para terras do Norte, para recordar as “Novelas do Minho”. Deveriam ser estas a ser “vistas”. E se voltássemos aos tempos de novelas escritas em jornais? Quem não esperaria pelo episódio seguinte para saber se Teresa iria fugir com Guilherme. Ou quantos de nós não esperaríamos para descobrir mais de Maria Moisés. A recém-nascida “pescada” ao largo do rio.
Quem nunca leu este pedaço de arte que atire a primeira pedra. Diz o marido: “Cá tem mais um, mulher!”, responde ela: “um quê, homem?”. “um crianço que pesquei no rio!”.
Não deve haver novela televisiva que nos tire a ficção de imaginar todos estes enredos lidos. Imaginem terem de comprar o jornal naquele dia da semana (o tão conhecido folhetim) para descobrir se a viúva há-de fugir com o enforcado. Não é isto fascinante? Que acham da ideia de aguardar o suspense para o próximo episódio?
Nostálgico… um tempo que nunca vivi. Podemos achar paralelo discutir-se uma série ou mesmo uma novela na TV, mas há muito que sabemos que nada substitui o prazer de ver as palavras lidas.
Preferia que os signatários se preocupassem mais com a obra de Camilo. Que interessa uma estátua se ainda há tanto para ler. E deixo isto para os felizardos leitores, ainda sobre a heroína Maria Moisés: “Se eu ficar sem ela (a quinta), é porque a reparti por muitos pobres; mas a melhor porção há-de ser a minha, porque o prazer de dar é muito maior que o de receber.”
Paulo Vigário
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