Poucos duvidam que o político que mais me causa urticária é Marcelo Rebelo de Sousa (MRS), mais pela função que ocupa e pela maneira como a ocupa. Também é verdade, e reconheço, que vejo poucas funcionalidades práticas na função que o mesmo ocupa. Felizmente nunca votei nele, mas também nunca votei em nenhum Presidente da República (PR). Arrisco-me a dizer que não reconheço relevância nesse cargo. É, no regime que se construiu, um despesismo do honorário público. Não quero aqui aprofundar isso, apenas para enquadrar alguma da impaciência que tenho com MRS, que seria com qualquer outro, mas que se evidencia pela maneira de exercer do atual PR.
Já passei por alguns 10 de junho desde que me tornei interessado pela política nacional, e todos eles, com o mesmo Chede de Estado. Sou daqueles que considero triste algumas das coisas que lá se fazem. A começar pela existência de uma comemoração do mesmo, ainda que aceite que se possa celebrar o dia. Ainda assim, tenho algumas questões: celebrar o 10 de junho é para quem? Porque o celebramos? Porque temos de olhar para os mesmos políticos que vemos todos os dias na televisão? Porque precisamos de um desfile militar? Ainda estamos em tempo de guerra? Não vos parece anacrónico? A quem queremos mostrar a nossa potente frota militar? Aos espanhóis que nos vão conquistar? Às províncias ultramarinas de Africa? Ficam elas aterrorizadas com esta demonstração de força das nossas Forças Armadas no dia 10? Ainda estamos nos tempos da Guerra do Ultramar?
Recordo que o 10 de junho é dia de Portugal, de Camões e das comunidades portuguesas. Como é recordado Portugal neste dia? Através de discursos vazios e sem conteúdo do PR? Através de momentos de propaganda de políticos dos partidos?
Já sei, celebramos Portugal através da visita do Chefe de Estado ao Reino. Este ano foi à Régua. Mas também já esteve em Portalegre, em Braga, no Porto. Ou para visitar as comunidades de França, EUA, Africa do Sul, Brasil, Reino Unido. Esta ideia de a corte do Reino ir visitar as várias comunidades é tao provinciano. Ver a corte percorrer os vários locais para que os seus povos não esqueçam o Reino e o seu Rei… desculpem chefe de Estado é… não sei… saloio.
O Estado Novo trouxe-nos, como propaganda política nacional, este dia para exacerbar as características nacionais. Alias até lhe chamou dia da “Raça Portuguesa”. Celebrávamos o sentimento de pertença a uma grande nação dos descobrimentos. Hoje, ainda que parte do nome da celebração tenha caído, não deixa de ser engraçado como existem bastantes semelhanças. MRS procura sempre exacerbar as características do País e dos portugueses através dos seus discursos que não acrescentam nada. Vazios. Com propositadas ambiguidades. Com jogos de palavras. Sem literalidade.
Eu sei, se não fosse o 10 de junho a corte não se deslocava ao país real. Nos tempos da monarquia existia uma visita do Rei ao país real. No 10 de junho, MRS traz-nos todos os anos isso à memória. Traz a sua corte, de políticos a altas patentes militares, pelo país dentro, para nos recordar dos tempos da monarquia. O povo, como bom cordeiro, vai atrás e assiste ao espetáculo da corte. Proponha uma mudança de nome: “Dia de Portugal, de Camões e da visita da corte ao Reino”.
Referi lá em cima, que era também dia de Camões… o que significa isso? É para recordarmos Camões? É para lembramos a língua portuguesa? É para nos lembrarmos de ler autores portugueses? É para voltar a ler os Lusíadas nessa altura? Acho que poucos são os que sabem porque temos de celebrar Camões? De que maneira esta ideia de termos língua comum está a ser lembrada neste dia?
Reconheço a importância do sentimento de nação e de que temos de nos ligar através de alguma coisa num mundo cada vez mais global. Encontrar semelhanças ajuda-nos a construir mais comunidade num mundo cada vez mais polarizado. Não tenho dúvidas disso, mas tem de ser feito assim? Passados 49 anos do 25 de abril ainda se faz o 10 de junho como o Estado Novo? Uma parada militar ajuda-nos a este sentimento de mais nação? Políticos na televisão ajudam a este crescer de uma comunidade? Uma visita de propaganda da corte ao Reino que me diz neste sentimento de pertença a uma nação comum?
Paulo Vigário
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